Por Rui Reis* A contentorização das cargas tem crescido a um ritmo superior do crescimento da economia mundial e a necessidade de se monitorar o seu estado ao longo da cadeia de valor logística é um imperativo.
Desde o início da década de 60 do século passado que a contentorização das cargas marítimas redefiniu o transporte marítimo de mercadorias.
Desde o primeiro navio que transportou contentores, o SS Ideal X – navio americano petroleiro adaptado para o transporte máximo de 58 contentores, até aos maiores navios da actualidade com capacidade superior a 23.000 contentores, passaram-se apenas 6 décadas.
A razão da contentorização das cargas é motivada essencialmente pela diminuição dos custos de movimentação das cargas. A redução de custos foi tão significativa, que a adopção deste novo modo de transporte foi muito rápido.
Em 1967 num relatório pedido pelo Ministério dos Transportes do UK à consultora Mackinsey estava bem expresso e como tendências bem marcadas, aquilo que viria num curto espaço de tempo tornar-se uma realidade e até em muitas situações além do previsto : a contentorização das cargas marítimas iria impactar toda a cadeia de valor do transporte marítimo de mercadorias.
A contentorização das cargas teve um efeito transformador em toda a cadeia de valor do transporte marítimo : os navios de carga geral deram lugar na sua maioria a porta-contentores, os portos tiveram que se preparar para as operações de carga e descarga deste tipo de navios e a intermodalidade logística (conexão em terra com os modos de transporte complementares – ferroviário e rodoviário) ganhou uma maior expressão.
Muitos outros efeitos e impactos decorrem daqui também: o muito menor custo dos bens transportados permitiu o desenvolvimento do comercio mundial, a relativa rapidez com que se podem transacionar os bens permitiram ás diferentes industrias adoptarem modelos de gestão optimizados (p.e. modelos de aprovisionamento JIT- Just in time), etc..
O rácio de contentorização de cargas ( cargas contentorizadas sobre o total de cargas movimentadas), cresceu sempre acima da taxa de crescimento mundial do PIB, tendo estabilizado a partir dos anos 2000 – Fig 1 (Saxon & Stone, 2017).
Desde o produtor até ao cliente final, as mercadorias atravessam uma complexa cadeia de valor com muitos intervenientes (Fig.2). Com o crescimento do comercio mundial e o crescimento ainda maior da contentorização das cargas, a necessidade de optimizar o processo logístico da movimentação de contentores é fundamental. Os portos têm uma localização que na sua maioria não permitem o seu crescimento e por isso o tempo de estadia dos contentores em porto deve ser o mais reduzido possível.
Torna-se por isso fundamental adoptar processos tecnológicos que permitam o controlo destes activos ao longo da sua cadeia logística.
São diversos os parâmetros que importa controlar: o mais evidente deles é a sua localização, mas também nalguns casos a temperatura dos bens transportados, se o contentor foi objecto de alguma colisão/embate que possa danificar a carga, se as portas do contentor permaneceram fechadas entre o momento do seu carregamento e o ponto de destino, etc..
Outro factor importante também é o da Segurança das vias marítimas: a colisão de navios com contentores perdidos no mar não é rara e pode constituir um perigo relevante para a navegação. Por exemplo, no Mar do Norte (um dos corredores marítimos mais concorridos) estima-se que devido a diversas razões, sejam perdidos ou caiam ao mar cerca de 300 contentores por ano.
Os beneficiários desta informação são praticamente todos os stakeholders do processo logístico: do produtor ao cliente final, passando pelos intermediários logísticos e pelas autoridades.
Existem já diversas soluções tecnológicas para se efectuar o controlo destes activos : de uma forma muito simples pretende-se instalar um sensor no contentor que capte os parâmetros pretendidos, que comunique (por diferentes meios) para um receptor que a disponibilizará para o destinatário final (Fig.3).
Parecendo aparentemente um tema simples (de facto determinar a latitude/longitude e medir parâmetros elementares como a temperatura, quebra de selo, registo de impacto não são per si grandes desafios tecnológicos), mas a sua adopção generalizada levanta muitas questões técnicas e económicas.
Um dos segmentos de cargas contentorizadas que já começou a adoptar este tipo de tecnologias foi o segmento das cargas contentorizadas refrigeradas. O controlo de temperatura ao longo de toda a cadeia logística é um factor crítico para a preservação da qualidade e características de base das cargas transportadas. O facto de que em termos médios o valor da carga transportada neste tipo de contentores ser bastante elevado, “pré-dispõe” os seus intervenientes a assumir este custo como necessário.
O desenvolvimento actual da tecnologia permite já alcançar níveis de custos dos sensores bastante inferiores aos que ainda se encontram no mercado (existem diversos sensores especialmente desenhados para serem usados em contentores mas nunca com um custo inferior a 100 USD, ao qual normalmente acresce um fee anual para disponibilização da informação. Este custo é ainda relevante se tivermos presente que um TEU- contentor de 20 pés – simples pode custar cerca de 1.800 USD e que um contentor refrigerado cerca de 25.000 USD). Por outro lado o custo das comunicações via redes como a SIGFOX permitem ultrapassar as questões do roaming e diminuir os custos das comunicações para patamares muito inferiores aos que as tradicionais 3G/4G actualmente oferecem.
Vamos assim assistir certamente a uma rápida adopção destas tecnologias de uma forma mais generalizada para melhor podermos gerir as várias centenas de milhões de operações marítimo/portuárias que se realizam com contentores.